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Conclusões

   A cogeração apresenta-se como sendo uma tecnologia de produção combinada de energia elétrica e de energia térmica da qual advém benefícios de diversos tipos e que podem essencialmente ser categorizados em económicos, sociais e ambientais. [2, 4]

 

   Atualmente, a generalidade da literatura, subdivide as tecnologias de cogeração passíveis de serem empregues a novos projetos em dois tipos denominados de convencionais e emergentes. As tecnologias convencionais, compreendem as turbinas a gás, as turbinas a vapor, os ciclos combinados, os motores de combustão interna, os motores a vapor e apresentam-se como sendo equipamentos que já se encontram numa fase onde a maturação tecnológica já foi alcançada. Em virtude do alcance deste patamar, estas são as tecnologias aplicadas à generalidade das centrais de cogeração existentes e as mesmas continuarão a ser empregues na maioria dos novos projetos que ainda venham a surgir. Quanto às tecnologias emergentes, as mesmas englobam essencialmente as microturbinas e as pilhas de combustível que, apesar de ainda não se encontrarem num estado de desenvolvimento tão avançado como as restantes tecnologias existentes, apresentam algumas vantagens que as podem tornar interessantes para aplicações mais pontuais. Contudo, é expectável que dado o seu potencial, estas sejam tecnologias em que num futuro próximo se irá investir e que, caso sejam resolvidas algumas das dificuldades específicas que têm afetado a sua proliferação, vejam a sua gama de aplicações substancialmente ampliada. [6, 7, 19, 23, 29]

 

   Tradicionalmente, a cogeração apenas se aplicava em locais onde se verificava a existência de vincadas necessidades de energia térmica sob a forma de calor, sendo assim este facto uma limitação na sua gama de aplicações. No entanto, e fruto da evolução tecnológica verificada ao longo das últimas décadas, têm surgido no mercado equipamentos dominados de chillers que, dada a sua crescente eficiência, têm vindo a colmatar este obstáculo. Assim sendo, e transformando energia térmica a elevadas temperaturas em energia térmica a baixas temperaturas, estes equipamentos têm contribuído de forma decisiva para o aumento do âmbito de aplicação das centrais de cogeração. Esta é de facto uma ilação aplicável ao caso concreto nacional uma vez que em Portugal, tal como analisado, existem várias centrais de cogeração que recorrem a sistemas de CCHP (que combinam sistemas de cogeração com chillers) e que se encontram localizados por exemplo em centros comerciais, ou mesmo em sistemas de DHC. [2, 6, 7, 19, 20, 35, 36, 37]

 

   Além da trigeração, outra adição à cogeração que se apresenta como sendo bastante interessante reside nos sistemas de armazenamento de energia térmica, seja esta sob a forma de calor ou sob a forma de frio. Estes dispositivos consistem simplesmente em grandes tanques de aço devidamente isolados que, ao armazenar eventuais excedentes térmicos, permitem aumentar de forma decisiva a flexibilidade de operação de um sistema de cogeração representando desta forma uma inegável mais-valia para o mesmo. [38]

 

   A nível nacional, a cogeração surgiu na década de 30 do século passado tendo começado pelo emprego de sistemas muito rudimentares e que se constituíam essencialmente por caldeiras conjuntamente com máquinas a vapor. Já na década de 80, em virtude da publicação da legislação que vinha introduzir o conceito de produtor independente, a cogeração começou a ganhar relevância tendo a sua potência crescido de forma considerável. Avançando no tempo, e com a publicação na década de 90 de um novo enquadramento legal próprio, o setor da cogeração ganhou novo fôlego e viu novamente a sua potência crescer de forma significativa. A partir de 1997, em virtude da introdução do GN em Portugal, não só devido ao apertar da legislação que tutelava as emissões de poluentes para a atmosfera como também da maior facilidade de operação de uma central que utilizasse este combustível, foram verificados novos investimentos em cogeração e foram ainda convertidas diversas das centrais já existentes que, apesar de não terem sido projetadas de raiz para o uso do referido combustível, eram compatíveis com o mesmo e ainda se encontravam aptas a funcionar por um período de tempo suficientemente interessante para que se obtivesse um adequado retorno do investimento. [42]

 

   Tendo por base os últimos dados existentes, a cogeração em Portugal totalizava no ano de 2013 uma potência instalada em torno dos 1300 MW. A nível tecnológico era de realçar a grande preponderância das turbinas a gás natural face às restantes tecnologias, seguidas pelos motores a gás natural. Já a nível da distribuição da potência, a mesma encontra-se essencialmente concentrada nas indústrias de papel, química e têxtil, sendo no entanto de destacar também a presença de sistemas de cogeração nas indústrias alimentar, cerâmica, hospitalar, de serviços, de madeira e de embalagens. Como se pode concluir através destes dados, a cogeração localiza-se em indústrias que são essencialmente exportadoras podendo assim representar para as mesmas um auxiliar ao fomento da sua competitividade, sobretudo se for tomado em consideração o peso que o abastecimento energético usualmente apresenta em unidades industriais. [42]

 

   Em 2010, e em virtude da transposição da Diretiva 2004/8/CE para a legislação nacional, foi realizado em Portugal um estudo de potencial de cogeração de elevada eficiência que identificou um potencial para novos investimentos em torno dos 952 MWelétrico, podendo este valor ser dividido em 700 MWelétrico para o setor industrial e 252 MWelétrico para o setor dos serviços. Em virtude dos benefícios proporcionados ao nível da poupança de energia primária pelos sistemas de cogeração, caso este potencial se atingisse o mesmo corresponderia a uma poupança significativa para o país não só ao nível da importação de combustíveis, como também da quantidade de CO2 que seria enviada para a atmosfera. No referido estudo foram igualmente identificadas barreiras de ordem económica, técnica e política que poderiam condicionar o alcance deste potencial, e foram ainda deixadas para análise possíveis soluções que contribuíssem para que os entraves identificados pudessem ser ultrapassados. [9]

 

   De acordo com os últimos dados existentes, referentes à realidade Europeia no ano de 2013, em termos de cogeração Portugal encontrava-se ligeiramente acima da média na quota desta tecnologia relativamente à produção total de eletricidade. Comparativamente à média dos restantes países europeus deve ainda ser destacada a maior preponderância de combustíveis renováveis, nomeadamente da biomassa, que em Portugal representava cerca de 26% do total da cogeração, enquanto que a média europeia se situava em cerca de 16.3 %.

 

  De todos os países que utilizam cogeração em solo europeu, deve sem dúvida ser realçada a Dinamarca. Neste país, sobretudo a partir da década de 70, foi verificado um investimento considerável neste tipo de sistema que muitas vezes foi também associado a redes de DHC. Mais recentemente, para além dos tradicionais sistemas de cogeração associados a redes DHC, a Dinamarca tem apostado também na trigeração, no armazenamento de energia térmica, no fornecimento de serviços de sistema e em alguma resposta dinâmica, conseguindo assim explorar praticamente todas as potencialidades que um sistema de cogeração pode proporcionar. [19, 42, 43, 63]

 

   A nível legal, a presente dissertação começou por realizar uma análise das peças legislativas mais recentes e que se revelaram importantes para o desenvolvimento da cogeração, tendo então iniciado esta fase do estudo pela Diretiva 2004/8/CE. Esta publicação, que visava essencialmente a promoção da cogeração de elevada eficiência, foi sem dúvida preponderante ao definir diversos conceitos que ainda hoje são aplicáveis e de que são exemplo, nomeadamente, o da poupança de energia primária e o formato de cálculo da eletricidade produzida em centrais de elevada eficiência. Na fase final desta diretiva encontrava-se imposto um prazo legal para que a mesma fosse transposta para a legislação dos vários estados membros, prazo esse que cessava em 2006 [8]. No entanto, e apesar da existência desta imposição, Portugal revelou-se um país incumpridor uma vez que só no ano de 2010, e com a publicação do DL n.º 23/2010, efetivou a transposição dessa diretiva. A publicação deste DL revelou-se como sendo uma autêntica revolução relativamente aquilo que se verificava na anterior legislação, que era definida pelo DL n.º 313/2001 juntamente com as restantes portarias que o complementavam, tendo então alterado significativamente o paradigma da cogeração que era verificado até então. A partir da sua entrada em vigor, que sucedeu em Março de 2010, o setor da cogeração passou então a estar dividido em duas modalidades distintas denominadas de modalidade especial e de modalidade geral. A modalidade especial, e tal como sucedia com a legislação que antecedia esta publicação, visava a injeção da totalidade da energia elétrica produzida na RESP. De forma a remunerar essa mesma energia o que se encontrava legalmente previsto é que a mesma fosse paga com um montante correspondente a uma tarifa de referência fixa juntamente com um prémio de eficiência e um prémio de energia renovável, prémios esses que apenas eram aplicáveis mediante o cumprimento de determinadas condições de elegibilidade e que poderiam ser distintos consoante alguns fatores que se encontravam previstos (nomeadamente a potência da central, o tipo de combustível, a PEP e a eficiência da central em consideração). Quanto à modalidade geral, esta veio introduzir um conceito que até então não existia e que consistia essencialmente na participação das unidades cogeradoras em mercados organizados, podendo nos mesmos comercializar a eletricidade produzida e recebendo pela mesma o montante horário de fecho de mercado bem como um prémio de participação em mercado. Acerca desta modalidade deve ainda ser referido que a mesma contemplava alternativamente à venda da totalidade da produção em mercado outras soluções para a energia elétrica, nomeadamente o estabelecimento de contratos bilaterais e os fornecimentos a clientes diretamente conectados à instalação de cogeração. Apesar do atraso na sua publicação, o DL n.º 23/2010 apenas se tornou completamente aplicável no ano de 2012 após a publicação de várias portarias e declarações de retificação complementares. Acerca deste decreto-lei revela-se importante referir que, após a sua publicação, a atividade da cogeração em Portugal sofreu um revés considerável marcado não só pela ausência de novos investimentos, como também pelo encerramento de mais de 40 centrais de cogeração que representam mais de 211 MW. [10, 11, 28, 52, 82]

 

   No ano de 2012, e cerca de 8 anos decorridos após a publicação da Diretiva 2004/8/CE, surgiu a Diretiva 2012/27/UE que visava quer a proliferação do emprego de soluções que visem a eficiência energética, quer a promoção da cogeração de elevada eficiência. No entanto, apesar do âmbito de aplicação desta diretiva não se revelar muito distinto daquele que havia sido verificado na diretiva anteriormente explicitada, esta foi mais além ao estabelecer mesmo a cogeração de elevada eficiência como sendo o standard da produção de eletricidade, sobretudo nos casos onde exista uma adequada utilização para a energia térmica. Além deste facto, e também à semelhança do que já havia sido feito anteriormente, esta diretiva veio impor a obrigação de todos os estados membros realizarem uma nova análise não só do potencial de cogeração de elevada eficiência, como também dos sistemas de aquecimento e/ou arrefecimento urbano, o mais tardar até ao final de 2015. [57]

 

   Da mesma forma que sucedeu aquando da publicação da Diretiva 2004/8/CE, também a Diretiva 2012/27/UE impôs um prazo para que os diversos estados membros efetivassem a sua transcrição para a legislação nacional. Mais uma vez Portugal revelou-se um país incumpridor, e só no passado dia 30 de Abril de 2015 essa transposição foi efetivada com a publicação do DL n.º 68-A/2015 que, de momento e em virtude da inexistência de duas portarias que o complementem adequadamente, ainda não pode ser completamente aplicável. Esta peça legal pode ser caracterizada por, apesar de manter a estrutura base do DL n.º 23/2010, introduzir algumas alterações que se concentram essencialmente na modalidade geral. Desta forma, a mesma foi subdividida em duas submodalidades distintas denominadas de submodalidade A e de submodalidade B. Na primeira, encontra-se expressa a principal diferença relativamente à anterior legislação uma vez que a mesma vem introduzir o conceito de autoconsumo em cogeração para centrais que, além de o pretenderem, apresentem uma potência de injeção igual ou inferior a 20 MW. Já a submodalidade B apresenta um maior grau de semelhança com a modalidade geral definida pelo DL n.º 23/2010 uma vez que se destina a todas as centrais de cogeração que pretendam operar num regime de venda total ou parcial da energia elétrica produzida em mercados organizados. Tal como se verifica nas centrais abrangidas pelo DL n.º 153/2014, que tutela o autoconsumo com exceção daquele que é feito com recurso a instalações de cogeração, também no caso de existir uma situação de autoconsumo com cogeração ao abrigo do novo enquadramento legal a mesma encontrar-se-á, a partir do momento em que se atinja um determinado limiar de nova potência instalada (891.7 MW), obrigada a proceder ao pagamento de uma compensação mensal e fixa durante um período de 10 anos. [3, 8, 57, 77]

 

   A nível prático, e numa fase anterior à da procura da resposta ao objetivo fulcral da presente dissertação, tentou-se compreender em que moldes é que a atividade de cogeração seria viável numa "situação tradicional" onde a totalidade da produção elétrica seria entregue às RESP, e remunerada de acordo com o enquadramento legal correspondente, enquanto que a produção térmica seria entregue ao cliente industrial, e remunerada ao preço que lhe custaria o combustível necessário à obtenção da mesma produção térmica que seria suprida pela cogeração. Para tal foram definidos 4 cenários distintos, para os quais se determinou a viabilidade, e que foram denominados de:

 

  • Caso Base: corresponde ao enquadramento da central em estudo ao abrigo do DL n.o 313/2001 em conjunto com a Portaria n.o 58/2002. Este cenário é considerado como sendo o caso base uma vez que a central se encontra atualmente ao abrigo do enquadramento remuneratório definido por esta legislação.

  • Cenário 1: corresponde ao enquadramento da central em estudo ao abrigo da modalidade especial do DL n.o 23/2010 e do DL n.o 68-A/2015, dadas as suas semelhanças.

  • Cenário 2: corresponde ao enquadramento da central em estudo ao abrigo da modalidade geral definida pelo DL n.o 23/2010.

  • Cenário 3: corresponde ao enquadramento da central em estudo ao abrigo da submodalidade B do DL n.o 68- A/ 2015.

 

   Relativamente ao cenário 2, o mesmo foi simulado em virtude de aquando do início da presente dissertação se encontrar em vigor o DL n.º 23/2010. Atualmente, em virtude da publicação do DL n.º 68-A/2015, para que um novo projeto possa surgir numa "situação tradicional" as opções existentes cingem-se à modalidade especial (cenário 1) e à submodalidade B da modalidade geral (cenário 3).

 

   Ainda antes de ser determinada a viabilidade de um investimento numa central de cogeração enquadrada numa situação semelhante à descrita, e no seguimento do procedimento implementado, ficou desde logo demonstrada a razão que levou, e tem levado ao encerramento de diversas centrais de cogeração assim que tiveram/tiverem de deixar de estar enquadradas ao abrigo do enquadramento remuneratório definido pelo DL n.º 313/2001. Desta forma, e tendo em consideração a queda abrupta ao nível da tarifa elétrica a que a eletricidade produzida em cogeração passa a ser remunerada aquando dessa transição, mesmo na melhor hipótese (que como se viu corresponderia à modalidade especial), para centrais antigas e que apresentem rendimentos elétricos mais baixos, torna-se complexa a obtenção de proveitos que superem os custos. Encontrando-se então conhecido o principal fator que tem originado os referidos encerramentos, e tendo em consideração que se pretendia proceder à implementação de um estudo de viabilidade para uma central nova, o procedimento empregue consistiu na simulação da realização de um investimento numa central que, apresentando uma produção idêntica à da exemplo, alcançasse um rendimento elétrico que fosse equivalente ao de uma central nova. Desta forma, e tendo em atenção os progressos tecnológicos verificados, esta situação distinguia-se da anterior não só por originar custos com combustíveis inferiores, mas também por proporcionar encargos de funcionamento mais reduzidos.

 

   Completa a determinação dos custos e proveitos alcançáveis através do investimento numa central mais moderna, e recorrendo ao sLCOE que, resumidamente, consiste num indicador económico que permite conhecer qual o proveito necessário para que no final do tempo de vida útil um determinado investimento apresente valor atual nulo, foi possível conhecer a viabilidade em cada um dos cenários considerados [112, 113, 114]. Assim, rapidamente se compreendeu que mesmo considerando em todos os cenários uma valorização da energia térmica que corresponderia à melhor situação possível, correspondente ao cliente industrial aceitar remunerar a mesma ao preço que esta lhe custaria numa caldeira a GN com eficiência de 90%, apenas no enquadramento correspondente ao DL n.º 313/2001 (cenário base) a cogeração se apresentava como sendo claramente viável. Desta forma, e tendo sido considerada uma valorização da energia térmica idêntica independentemente do enquadramento legal adotado em cada um dos cenários abrangidos, mais uma vez se realça que a proveniência das substanciais diferenças existentes entre os vários cenários tem origem exclusivamente na valorização da energia elétrica. Assim, tanto na modalidade especial dos DL n.º 23/2010 e n.º 68-A/2015 (cenário 1), como na modalidade geral do DL n.º 23/2010 (cenário 2) com venda da totalidade da produção em mercados organizados, o investimento numa central de cogeração apresentaria uma viabilidade extremamente reduzida, revelando-se assim um investimento com um considerável índice de risco. Destacando os reduzidos preços verificados em mercado bem como a cessação do pagamento do prémio de participação em mercado, a submodalidade B do DL n.º 68-A/2015 (cenário 3) apresenta-se como proporcionando um proveito de tal forma reduzido que nunca sequer seria suficiente para que fossem pagos os custos com GN. Desta forma tornou-se clara a razão pela qual novos investimentos nesta área não surgiram após a publicação completa do DL n.º 23/2010 nem irão surgir, pelo menos na submodalidade B do DL n.º 68-A/2015 com venda da totalidade da produção elétrica em mercado. Ainda acerca dos vários cenários legais analisados neste estudo de viabilidade numa "situação tradicional" de cogeração deve ser realçado que, contrariamente ao que acontecia ao abrigo da anterior legislação onde as modalidades geral e especial eram praticamente equivalentes a nível remuneratório, na atual legislação tal não acontece. Nesta o "fosso" existente entre a modalidade especial e a submodalidade B (que se encontra incluída na modalidade geral) é de tal forma abissal que na primeira existe a possibilidade, embora remota, de ser proporcionada alguma viabilidade, enquanto que na última esta hipótese nem sequer se coloca.

Relativamente ao estudo de viabilidade de uma central de cogeração enquadrada num regime de autoconsumo, e de forma a dar resposta ao objetivo principal desta dissertação, foram criados dois cenários.

 

  • Cenário 1: corresponde ao enquadramento da central em estudo num regime próximo do de autoconsumo ao abrigo da modalidade geral do DL n.º 23/2010

  • Cenário 2: corresponde ao enquadramento da central em estudo num regime de autoconsumo ao abrigo da submodalidade A do DL n.º 68- A/ 2015.

 

   Aquando do início da presente dissertação, e apesar de ser conhecido que em virtude do prazo fixado na Diretiva 2012/27/UE a legislação da cogeração teria de ser alterada, pelo menos até ao dia 19 de Março de 2015 não era expectável que essa alteração sucedesse durante o período de realização da mesma [57, 105]. Desta forma, e uma vez que no anterior enquadramento legal não se encontrava explicitamente definido o autoconsumo, o referido estudo foi desenvolvido com base na situação mais próxima do mesmo passível de ser verificada ao abrigo da legislação que até então se encontrava em vigor (cenário 1). Assim sendo, depois de devidamente analisados e tratados os dados de um cliente industrial que foi tomado como exemplo, bem como terminada a simulação da sua fatura na ausência de cogeração e de terem sido simulados os custos e fluxos energéticos que se verificariam com a instalação de um sistema de cogeração semelhante ao tomado como exemplo, foi implementado um estudo de viabilidade.

No entanto, e tendo em consideração a publicação do DL n.º 68-A/2015 no passado dia 30 de Abril de 2015, o cenário 1 deixou automaticamente de ser válido para novos projetos que pudessem surgir uma vez que a legislação em que o mesmo se baseava passou imediatamente a ser inaplicável. Assim, e uma vez que na submodalidade A da modalidade geral passou a estar explícita a situação de autoconsumo com cogeração (cenário 2) que, teoricamente, se aplicará desde a data da sua publicação em diante, foi realizado um estudo semelhante mas tendo em atenção as particularidades que a nova legislação veio incutir. [3]

 

   No cenário 1 tornou-se possível concluir que mesmo na situação mais favorável para a cogeração, correspondente ao cliente industrial remunerar os dois tipos de energia fornecidos de forma indiferente relativamente àquela que se verificaria na ausência de cogeração, a mesma só seria viável caso fossem considerados os proveitos provenientes dos dois tipos de energia capazes de serem fornecidos pela central de cogeração.

 

   De forma análoga, também no cenário 2, a cogeração apenas se apresentaria como sendo um investimento viável caso fossem devidamente contabilizados a totalidade dos proveitos provenientes do autoconsumo térmico e elétrico. Demonstrou-se que caso a central funcionasse apenas a totalidade das horas de ponta a sua viabilidade seria máxima e existiria ainda a necessária margem para que funcionasse também não só na totalidade das horas de cheias, como de vazio e super vazio. No entanto, deve-se realçar que aumentando o número de horas de funcionamento a diferença entre o proveito total e o sLCOE se reduz. Porém, e mesmo numa situação correspondente ao funcionamento em horas de pontas e cheias com a cogeração a ser detida pelo cliente industrial e valorizada adequadamente, a margem existente apresenta-se como sendo reduzida, podendo desta forma não se revelar suficientemente motivadora para que a cogeração volte a proliferar.

 

   Relativamente ao cenário 2, considerou-se uma hipótese de valorização dos excedentes onde estes seriam remunerados a um montante correspondente ao preço de mercado verificado na hora onde os mesmos seriam injetados na RESP (o preço considerado é relativamente mais favorável do que o aplicável a uma situação de autoconsumo prevista para as restantes tecnologias de produção elétrica ao abrigo do DL n.º 153/2014, onde os excedentes são remunerados com um montante correspondente a 90% do preço médio de mercado verificado naquele dia [77]). No entanto, a existência de excedentes deve ser evitada ao máximo sobretudo devido ao facto de o valor do preço de mercado ser, mesmo nas horas de ponta onde este usualmente se encontra num patamar mais elevado, significativamente mais reduzido do que o custo total ao qual qualquer cliente industrial adquire a energia elétrica de que necessita. Desta forma, caso exista um excedente significativo o mesmo levará a que o proveito elétrico nessa situação se reduza o que poderá ter consequências diretas na viabilidade da central. Esta revela-se de facto uma situação a ser estudada minuciosamente aquando do projeto de uma nova central de cogeração uma vez que, apesar das boas práticas do setor afirmarem que uma central deste tipo deve ser dimensionada de forma a satisfazer as necessidades térmicas existentes, caso se verifique que estas são acentuadamente díspares das elétricas e se pretenda enquadrar a central nos moldes da submodalidade A existirá a necessidade de verificar se de facto a instalação e viabilização de um sistema de cogeração se torna exequível.

 

   Tomando em consideração os estudos legais e de viabilidade que foram realizados na presente dissertação, torna-se possível concluir que, sobretudo aquando da publicação do DL n.º 313/2001 e da restante legislação complementar, havia a pretensão administrativa de democratizar a cogeração tendo sido essa a razão principal para que tivessem sido criadas condições altamente favoráveis e que tornassem possível a viabilização deste tipo de investimento num período relativamente breve. No entanto, e apesar de atualmente a conjetura ser significativamente distinta, os reais benefícios da cogeração, de que são exemplos absolutamente inegáveis e fulcrais a poupança de energia primária, a redução das perdas nas redes, das emissões poluentes e da importação de combustíveis fósseis, não deixaram de ser verificados. Desta forma, e tendo em consideração todas as vantagens que a cogeração pode proporcionar quer ao país, quer no reforço da competitividade do local onde se encontre inserida, a mesma deveria continuar a ser promovida, algo que poderia ser conseguido através da definição de um enquadramento regulatório que proporcionasse uma rentabilidade que fosse minimamente aceitável. Tendo em conta os sucessivos apelos da Comissão Europeia nesta área, e que se encontram claros na Diretiva 2004/8/CE, na Diretiva 2012/27 /UE, através dos estudos de viabilidade realizados e do conhecimento da atual legislação da cogeração em Portugal, torna-se possível afirmar que o nosso país se encontra em claro contrassenso com o que seria ambicionado. Esta discrepância vem sendo notada sobretudo nos sucessivos encerramentos de centrais e na inexistência de novos investimentos. Após uma completa análise da atual legislação e consequente realização de estudos de viabilidade, mesmo não sendo conhecida para já a legislação complementar ao DL n.º 68-A/2015, não se espera que seja o mesmo a reverter esta situação. Desta forma, a atividade de cogeração em Portugal encontra-se numa situação preocupante na qual a dificuldade de viabilização deste tipo de projeto aliada à crise sentida tem levado à paragem completa do desenvolvimento deste setor que, tal como analisado, poderia levar a que o país conseguisse um retorno interessante a diversos níveis. [8, 11, 57]

 

   Concluindo, apesar de teoricamente ser uma solução extremamente interessante, não será certamente o autoconsumo aliado à cogeração que irá reverter de forma clara esta situação, urgindo portanto encontrar maneiras de além de proporcionar a proliferação da cogeração em locais onde tal se justifique, não se incorrer em encargos que possam de forma alguma condicionar a situação económica do país.

 

 

 

 

 

 

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